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A mostrar mensagens de outubro, 2011

A Encruzilhada

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Cá estou, de cócoras sobre uma galinha meio-morta e dessangrada. Observo com atenção os desenhos que fiz no chão de terra, dois pequenos desenhos que tão aplicadamente criei com pólvora e farinha. O primeiro tem a forma de uma grande cruz num pedestal, com um pequeno caixão dos dois lados. O segundo é um coração salpicado de estrelas e riscas de farinha a serpentear em volta dele. Uma coluna de madeira liga o chão ao tecto. De olhos fechados, tomo fôlego e o ar denso enche-me com o cheiro do espaço que me rodeia. A doçura untuosa da palha que recheia os muros de adobe, gastos e amarelados; a irritação invisível do pó preto e branco, espalhado pela terra; o odor doce e fluido da cera de cem velas a derreter-se; o resquício metálico do sangue do animal que reflecte o preto do tecto, já coberto de fuligem. Cheira a carvão queimado e a suor e a couro. Uma faixa castanha é tudo o que ainda cobre a minha pele, agora e sempre. Ajoelho-me diante de um altar coberto de vapor. Levanto os ol

O DISCO QUE MUDOU PORTUGAL

  Na capa do single „Chico Fininho” de 1980 pode-se ver um jovem magro e bigodado, com óculos estilo aviador, uma guitarra pendurada no ombro, a mão com relógio de pulso colocada na anca, um ar despreocupado, em frente dele – o microfone. O jovem – Rui Manuel Gaudêncio Veloso – em 2010 celebrou 30 anos de carreira no palco; a canção sobre o „freak da Cantareira” abriu-lhe a porta ao grande sucesso que dura até hoje.   O grande Rui Veloso tinha a mesma idade que eu agora, quando gravou o disco que iria revolucionar a música portuguesa: „Ar de Rock” (1980). Foi em 1976 que Veloso iniciou uma amizade e, ao mesmo tempo, colaboração com outro jovem com gostos musicais parecidos aos seus, Carlos Alberto Gomes Monteiro , conhecido como Carlos Tê. No princípio os dois amigos trabalhavam com músicas em inglês, mas a editora, interessada em assinar contrato com eles, exigia que escrevessem e cantassem em português. Tê escreveu as melhores letras que se podia sequer sonhar, história