METRO DE LISBOA - UMA GALERIA DE ARTE SUBTERRÂNEA
Para escrever o meu artigo sobre um aspeto da cultura e
vida portuguesa não escolhi o fado nem as sardinhas ou outra coisa tão
caraterística pois considero que já está escrito e contada muita coisa sobre esses
assuntos.
Tive muita sorte em morar em Lisboa durante três meses,
por isso sabia que iria ser algo relacionado com esta cidade. A minha escolha
foi o metro, que durante este tempo foi basicamente o meio de transporte que
mais utilizei. Viajando nele reparei que algumas estações são mais
interessantes do que outras – pela sua construção e decoração. Por isso decidi
vê-las todas e documentá-las através de fotografias. Depois deste trabalho, que
demorou bastante tempo, fiz pesquisa sobre os autores das ilustrações do metro
e as razões da sua existência nesse sítio. O que encontrei dá material para um
livro, mas tentarei resumi-lo num artigo conciso e concreto de forma a
incentivar-vos a viver esta aventura e descobrir o metro por vocês mesmos.
Porque vale a pena.
Um pouco de história
O sistema de metropolitano tem já 56 anos. O nome que se
repete nos textos sobre a sua história é o de Francisco Keil do Amaral, o
arquiteto que desenhou as primeiras estações e com muitas a ficarem até hoje sem
muitas transformações. O seu desenho implicava revestimentos em azulejos que cobrem
hoje quase cada estação. Com o tempo e com a criação de novas estações nasceu
também a necessidade de organizar e decorar as estações. Nessa medida,
dotaram-se essas novas estações de intervenções de quatro artistas
contemporâneos portugueses. Rolando Sá Nogueira (nas Laranjeiras), Júlio Pomar (no
Alto dos Moinhos), Manuel Cargaleiro (no Colégio Militar/Luz) e Vieira da Silva
(na estação da Cidade Universitária), deram o seu contributo no enriquecimento
das estações do metro. Desde aquele momento que a arte passou a ser uma parte
integral das estações.
Começar a aventura - Linha vermelha
A Linha vermelha foi a que eu apanhei com mais frequência
e aquela que fiquei a conhecer melhor entre todas aquelas por onde passei. Nesta
linha quero destacar as seguintes estações: Olaias, Aeroporto, Chelas, Oriente,
Olivais e Saldanha.
Olaias
Uma das estações inauguradas no ano da Expo 98, em
conjunto com Alameda, Bela Vista, Chelas e Oriente. Uma estação enorme com
espaço muito grande, no cais e no átrio. O projeto arquitetónico é da autoria
do arquiteto Tomás Taveira, que também contribuiu no tratamento plástico da
estação juntamente com os artistas plásticos Pedro Cabrita Reis, Graça Pereira
Coutinho, Pedro Calapez e Rui Sanchez. No ano 2012, um artigo da Impact your World, da cadeia de
televisão norte-americana CNN, escolheu esta estação como uma das dez mais
belas da Europa.
Não se pode negar esta beleza – a estação está cheia de
cores e elementos arquitetónicos muito interessantes. A minha favorita é a
sardinha gigante. Predomina a cor vermelha (utilizando associações com cores da
mesma linha) mas não falta também o branco, amarelo ou azul. Tudo cria uma impressão
dum grande aquário com muitos tipos de plantas marinhas que brilham debaixo de
água.
Nos cais e no átrio de Olaias encontramos alguns
elementos específicos, como uma escultura em chapa metálica pintada de preto e
branco, denominada “Ascensão”. Trata-se de uma escadaria que proporciona ao
cliente do Metropolitano uma “subida simbólica”, num local onde convergem as
próprias escadarias e escadas rolantes da estação.Nas quatro paredes de acesso
aos cais há um revestimento em baixo-relevo numa textura arenosa representando
marcas de mãos que simbolizam o movimento da passagem humana pelo local – a
individualidade de cada um.
Aeroporto
Esta é a primeira estação vista por muitos turistas que
chegam a Lisboa de avião. O projeto é da autoria do arquiteto Leopoldo de
Almeida Rosa e as intervenções plásticas do artista plástico António Antunes, cartoonista.
As figuras foram produzidas em pedra branca e negra.
Todas as peças que compõem as figuras foram recortadas a jato de água,
constituindo cada uma delas uma peça de um puzzle.
Do trabalho desenvolvido por este ilustrador resultou um
conjunto de 50 figuras em 49 painéis dispersos pela estação, constituindo assim
uma homenagem a várias figuras representativas da história moderna de Portugal,
que dão as boas vindas aos visitantes que entram em Lisboa. Para mim foi e
ainda é um mistério adivinhar os nomes destas figuras. Uma delas acho que pode
ser Marisa, fadista portuguesa conhecida em tudo o mundo, mas no futuro, para
decifrar o resto, vou ter de fazer mais pesquisa.
Chelas
Chelas fica mesmo ao lado do Instituto Superior de
Engenharia de Lisboa. Uma das mais coloridas estações, o projeto arquitetónico
é da autoria da arquiteta Ana Nascimento e as intervenções plásticas do artista
plástico Jorge Martins que implicou a conceção do revestimento de,
praticamente, toda a área da estação, tendo mesmo sido revestidas as colunas a
azulejo.
Oriente
Esta
estação faz parte da Gare do Oriente, que serve as Linhas do Norte, Sintra e
Azambuja. Fica ao lado de Parque das Nações. Está cheia de obras de vários
autores – entre outras uma polaca. O projeto arquitetónico é da autoria do
arquiteto Sanchez Jorge e as intervenções plásticas dos artistas plásticos
António Ségui, Artur Boyd, Errö, Hundertwasser, Yahou-Kussuma, Joaquim Rodrigo,
Abdoulaye Konaté, Sean Scully, Raza, Zao Wou Ki e Magdalena Abakanowicz. A
estação Oriente faz enorme impressão sobretudo pelo seu tamanho e pela
quantidade de obras artísticas que podemos admirar nela. O tema de todas obras
que podemos ver foi o tema principal da Expo ’98 – Os Oceanos. Convidar artistas plásticos para intervirem nas
várias estações novas ou em remodelações das antigas foi uma ideia sempre promovida
pelo Metropolitano de Lisboa. Nesta estação compreende-se que o Metropolitano
tenha alargado o seu convite a artistas de todo o Mundo. Para isso foram
convidados onze artistas de reconhecido mérito internacional representativos
dos cinco continentes – cinco europeus, três asiáticos, um africano, um
americano e um australiano.
Olivais
Esta estação chamou a minha atenção pela presença da
calçada portuguesa. Não é a única estação com o chão arranjado deste modo, mas
acho que é a mais chamativa. No entanto não faltam também as imagens que
podemos observar nos azulejos que cobrem as paredes dos cais. Estas estão
relacionadas com uma personagem histórica – o navegador Vasco da Gama. Os painéis
de azulejos do revestimento dos cais de embarque são da autoria de Nuno de
Siqueira. Neles o artista pretende lembrar a participação portuguesa no
desenvolvimento da modernidade que, segundo ele, se consubstancia na viagem de
Vasco da Gama. No seu trabalho Nuno de Siqueira pôs alguns símbolos ligados à história,
tais como: Cérberos (da mitologia grega), a Torre de Belém, Fátima, uma saída
de uma nave.
Linha verde
Na linha verde as estações mais interessantes são Cais do
Sodré, Marquês de Pombal e Alvalade.
Cais do
Sodré
Uma das minhas estações preferidas, devido à presença dos
imagens dos coelhos enormes como se fugissem diretamente das páginas do livro
de Lewis Carroll – “Alice no País das Maravilhas”. Debaixo dos coelhos podemos
ler: „estou atrasado”, que não deixa nenhuma dúvida que a inspiração vem do
mesmo livro. Esta intervenção plástica vem de António Dacosta, pintor
surrealista e depois abstrato, que foi também membro do Grupo Surrealista de
Lisboa. Antes de falecer deixou alguns esboços para a estação do Cais do Sodré
que foram integrados na estação segundo a interpretação do pintor Pedro Morais.
Marquês de
Pombal
Esta estação tem pouca decoração (em comparação com
outras já descritas) – somente uma figura duma personagem misteriosa que se
repete em vários sítios. O que lhe dá este aspeto de mistério é que não podemos
ver a cara dessa personagem. Mas não é difícil adivinhar quem é. O Marquês de
Pombal, figura carismática da história portuguesa, que dá nome ao local,
constitui o mote principal das intervenções plásticas de Menez e João
Cutileiro.
No espaço que separa as duas linhas o escultor João
Cutileiro colocou a figura do Marquês de Pombal representado com o seu atributo
mais identificativo, a exuberante cabeleira. Numa das mãos segura um rolo de
papel, possivelmente os planos de reconstrução da cidade, ou os seus tão
célebres decretos. As esculturas encontram-se sempre de costas para acentuar o
caráter enigmático e misterioso desta controversa figura histórica.
Alvalade
A minha primeira associação depois de ver as imagens dos
cais desta estação foi o circo, sobretudo pelas cores fortes e alegres, pela presença dos animais e por cenas grotescas.
Mas depois de consultar fontes adequadas já sei que o verdadeiro tema foram as
mulheres, os animais e o jogo de sedução. Alguns pormenores do grafismo são
inspirados na história tradicional portuguesa “O MACACO DO RABO CORTADO, que do
rabo fez navalha, da navalha fez sardinha…” que aparecia no livro da primária. Assim
num dos painéis de azulejos aparece o macaco desconfiado a olhar para a tesoura
e a sardinha. Noutro painel, o tema da noite, simbolizado pelo mocho, bicho
misterioso, um voyeur silencioso. No painel de maiores dimensões as meninas
jogam à maneira da belle époque. Vale a pena mencionar que todos os azulejos
foram pintados à mão com a técnica da majólica.
Linha Azul
Na
linha azul destacam-se as estações: Colégio Militar/Luz, Jardim Zoológico,
Laranjeiras, Alto dos Moinhos, Parque.
Colégio
Militar/Luz
Uma das estações mais azuis. Na mesmo site do metro de
Lisboa podemos ler que “Manuel Cargaleiro
deixou ao alcance do cliente do Metropolitano a possibilidade de apreciar uma
obra onde é utilizado o Saber Secular da Arte do Azulejo.”
Jardim
Zoológico
A decoração desta estação está vinculada com o nome dela.
Das paredes olham-nos animais desenhados nos amáveis tons de amarelo, verde
claro e azul claro. Júlio Resende,
autor do grafismo, deu vida a todo este enorme espaço e a proximidade do Jardim
Zoológico trouxe-lhe a inspiração da temática: a natureza, a fauna e a flora
tropicais. Para realizar esta tarefa Resende esteve dois anos a pintar pela sua
própria mão toda esta enorme superfície. Para o chão escolheu a calçada à
portuguesa, que aqui fugiu aos desenhos tradicionais, cobrindo-a com sinuosas
cobras que orientam os caminhos, plantas e flores que” brotam” do chão. Encontramos
assim, nesta estação do Jardim Zoológico, um imaginário tropical de grande
beleza.
Laranjeiras
Se a
inspiração da decoração da estação Jardim Zoológico foi óbvia, Laranjeiras
também não vai ser nenhum mistério. As paredes dos cais ficam decoradas por imagens
das enormes laranjas. O que é interessante é a técnica de que a obra está
feita. Sá Nogueira, o autor, passou a determinada altura a recorrer à
fotografia enquanto método possível de obter uma representação hiper-realista.
É dentro desta fase que se pode incluir o trabalho plástico da estação
Laranjeiras. As laranjas parecem umas
fotografias enormes feitas nos azulejos das paredes da estação.
Alto dos
Moinhos
A decoração desta estação pode ser facilmente confundida com
o simples street art – os grafismos parecem esboços recém-feitos só com uma
caneta. Tendo presente que nos espaços públicos surgem de forma natural e
espontânea graffitis, Júlio Pomar resolveu antecipar-se às mãos anónimas,
colocando aí “graffitis” da sua própria lavra. Desta maneira o artista homenageou quatro nomes das letras portuguesas, Camões, Bocage, Pessoa,
Almada, com os quais as imagens estão diretamente relacionadas.
Parque
Considero esta a estação mais gira de todas. Depois de sair
do metro senti-me como se tivesse chegado a um outro mundo – um mundo
submarino. Tudo isto pela sensação da omnipresente cor azul. Depois desta
primeira impressão comecei a examinar os azulejos de maneira mais minuciosa. Encontrei
uma quantidade inumerável de símbolos relacionados com a temática da Expansão e
Descobrimentos portugueses em alternância com frases de escritores, poetas, e
filósofos. Entre vários símbolos e imagens podemos encontrar “um mapa-mundo com a indicação das rotas que
os portugueses trilharam, delimitadas por retângulos numerados, que por sua vez
vão surgindo ao longo das plataformas, seguindo uma lógica temático-cronológica.”
Para a compreensão deste enorme conjunto de informação, a
autora dá-nos a chave da simbologia usada nas legendas dos mapas, que se
encontram nos lanços das escadas que dão acesso aos cais, escrevendo: “Estas
imagens são símbolos e representam ideias maiores que elas próprias". Este
trabalho está cheio de conteúdo simbólico, que permite aos utilizadores do
metro terem algo de interessante e enriquecedor para descobrir todas as vezes
que passarem por esta estação.
Linha Amarela
As estações que se devem ver nesta linha são: Saldanha,
Campo Grande, Campo Pequeno, Picoas.
Saldanha
Nos cais da linha amarela na estação do Saldanha
encontram-se os painéis com imagens feitas nos azulejos. Cada um deles está
descrito, assim temos: os quatro elementos,
Terra, Água, Ar e Fogo, as estações do ano, momentos como o Encontro, a
Despedida e a Espera. Os cinco sentidos, figuras de convite e motivos
decorativos ao gosto barroco com presença dos elementos dourados, estão
colocados em nichos. Predominam cores amarelas e castanhas, tudo fica muito
giro e cria uma total coerente. Lendo as informações mais detalhadas averiguei
que esta intervenção plástica evoca o trabalho de Almada Negreiros, e ficou a
cargo do seu filho José Almada Negreiros, centrando-se na sua obra literária
(manifestos, poemas, romances e teatro) e na sua obra plástica como desenhos e
pinturas de grande dimensão.
Campo
Grande
Uma estação com decorações um pouco escondidas (não ficam
nos cais) e muito surpreendentes. No espaço interior da estação Campo Grande o
artista Eduardo Nery realizou uma decoração baseada em figuras típicas da
azulejaria do século XVIII, as “figuras de convite”, que habitualmente eram
colocadas à entrada, numa atitude de boas-vindas. A adaptação destas imagens históricas é mudada para a maneira
moderna, um pouco surrealista. As imagens pintadas com tradicional cor azul
ficam quebradas e desmontadas mediante uma mudança dos sítios dos mesmos
azulejos e depois novamente compostas. O efeito artístico é muito engraçado e
interessante. Acho que foi esta a estação onde decidi documentar cada imagem da
decoração encontrada.
Campo
Pequeno
No
cais da estação do metro Campo Pequeno a primeira coisa que chama a nossa
atenção são as figuras dumas pessoas feitas de mármores portugueses colocadas
numas plataformas. As pessoas têm com eles vários objetos: as cartas, uma cesta
com frutas, um jarro. O local da estação é uma zona de Lisboa onde se dava a
entrada na cidade das populações das zonas rurais que a envolvem, e que vinham
à cidade vender os seus produtos. Francisco Simões com este seu trabalho
homenageia estas figuras típicas. O autor considera-se um descendente dos
escultores da escola de Mafra, das suas técnicas manuais de dar vida à pedra.
Picoas
Foi uma das estações que resultou ser difícil para mim de
decifrar e interpretar. O que reparei foram imagens simbólicas, como o barco do
escudo de Lisboa, mas não averiguei a sua temática que são as mulheres de
Lisboa. Nos azulejos dos cais podemos ver imagens das Mulheres de Trabalho – vendedeiras, peixeiras, vultos negros
estilizados, numa atitude que pretende acentuar a sua dignidade e elegância. A
heráldica da cidade de Lisboa, a barca com os corvos, a bandeira negra e branca
da cidade, colunas romanas, tudo isto resulta ser um conjunto temático.
Mas o que despertou a minha verdadeira curiosidade fica desta
vez ao ar livre. Estou a falar duma entrada de estilo Arte Nova, a única assim,
muito distinta das outras entradas do metro. Por uma perfeita casualidade alguns
dias depois de a ver encontrei uma fotografia do metro de Paris. As entradas
dali são iguais. A solução deste mistério encontrei-a outra vez no mesmo site do metro: No átrio Sul, acesso da Rua
Andrade Corvo, oferecida pelo Metropolitano de Paris e inserida num programa de
intercâmbio cultural entre redes de metropolitano, foi instalada uma peça de
mobiliário urbano, conhecida por acesso Guimard. Estes acessos foram criados no
início do século por Hector Guimard, grande nome da Arte Nova, para ornamentar
as entradas do Metropolitano de Paris.
Esta é uma
peça emblemática da Arte nos Metropolitanos e, quando surgiram, tiveram grande
impacto na paisagem urbana parisiense. O estilo artístico em que foram
construídas, não sendo conhecido da generalidade das pessoas, estas
designavam-no por “Estilo Metro”. Hoje estas peças fazem parte integrante do
património artístico parisiense, constituindo mesmo um “ex-libris” da cidade.
Tudo
isto foi uma grande aventura lisboeta que realizei durante três semanas da
minha pesquisa. Fico muito contente de ter escolhido este tema porque trouxe-me
muita diversão e muita satisfação. Com este texto quero incentivar toda a gente
a visitar as estações que descrevi e para fazer pesquisas parecida à que fiz, nesta
cidade de maravilhas: Lisboa.
Estera
Małek
Falta aqui a estação de Entrecampos com os painéis alusivos aos descobrimentos e aos poetas e escritores clássicos
ResponderEliminarObrigado pela chamada de atenção.
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