Entrevistas improváveis


Uma entrevista inacabada com o Conde Drácula

Henio Trolejbus: Senhor Drácula, como se sente hoje? Sabemos que ultimamente tem tido problemas de saúde.
Conde Drácula: Estou bastante bem. Tomei os medicamentos prescritos pelo meu psiquiatra. Todos os meus problemas como úlceras ou insónia são resultados da depressão.
HT: O que é que o seu psiquiatra diz sobre a causa da doença?
CD: Diz que está relacionada com o estresse. Como presidente da Ordem de Vampiros estou muito preocupado com os últimos acontecimentos e a fama atual do meu género.
HT: Que acontecimentos?
CD: Trata-se sobretudo do lançamento deste livro para crianças com deficiência mental: Madrugada, Amanhã, Tarde, Noite... não me lembro agora do título. Pois, pago muito ao meu psiquiatra para poder esquecer-me. Dantes, eramos monstros assustadores. Fomos inspiração para autores de livros de terror. Ao ler na descrição do filme a palavra «vampiro» já se sabia que se ia ver uma imagem misteriosa, sinistra, que não deixava dormir, com muito sangue...
HT: É verdade que os vampiros podem sobreviver sem beber o sangue humano?
CD: Disparate! Graças a esta necessidade causamos tanto temor. Todos sabiam que não éramos capazes de controlar esta fome. Assim, as nossas vítimas quando atacadas morriam de medo sabendo o seu destino. E agora acham que as queremos abraçar. Dantes, o vampiro significava morte, hoje significa amor.
HT: Considera ofensiva esta associação?
CD: Pois, claro! Cuidamos da nossa reputação durante séculos mantendo uma atmosfera de terror perto de nós. Conseguimos criar um conjunto de características próprias do nosso género: força, poder, majestade, elegância, escuridão... E de repente este idiota brilha no sol!
HT: Então, o que realmente se passa com a pele de um vampiro em contacto com os raios de sol?
CD: Matam-nos.
HT: Mas... Não estão já mortos?
CD: Pois... Antes de fazer estas perguntas, deve saber que hoje tenho muita fome...
HT: O que tem são úlceras e eu sou difícil de digerir.
CD: Está a ver? Já ninguém tem medo de nós! É o nosso fim! O nosso império construído há séculos chega ao fim. Não há esperança! Não há futuro. Não há nada...
HT: Senhor Drácula?...


«Detesto o Patinho Feio!» entrevista com Hans Christian Andersen

Henio Trolejbus: Desculpe por ser pomposo – qual é o sentido da vida?
Hans Christian Andersen: Desculpa por ser honesto – a vida não tem sentido. Nascemos só para morrer. Afinal, o único que resta de nós é uma lantejoula enegrecida pelo fogo. Cinza. Mais nada.
HT: Esta é a mensagem que quer transmitir às crianças com os seus contos?
HA: O meu objetivo é representar a realidade tal como é. A morte faz parte da vida, não se pode viver felizmente para sempre. As pessoas matar-se-iam se tivessem de viver para sempre. Podem ficar juntos e continuar a amar-se, na maior felicidade, até se partir.
HT: Isto é o que considera o happy end?
HA: Viver até à morte? Sim, parece-me muito happy end.
HT: Quando se vive na miséria também?
HA: Claro! Neste caso a morte põe fim à miséria, à fome, à prisão da vida.
HT: Então, aconselha aos seus jovens leitores para que se matem?
HA: Não, não. Eu aconselho que tenham esperança.
HT: Como a rapariguinha dos fósforos?
HA: Como o patinho feio. Maltratado na infância tornou-se bonito e ficou feliz.
HT: Quer ensinar às crianças que a beleza dá felicidade? Que só o branco é bonito? Um feio não merece o respeito por si mesmo, mas por ser um feio que pode tornar-se bonito um dia?
HA: Essas são perguntas para o meu editor e advogado. Na versão original um dos patos suicida-se por não poder suportar tanta humilhação e o outro ao tornar-se um cisne forte procura a vingança pela morte do seu irmão. Eu não escrevi nada sobre beleza.
HT: A vingança? Não é um motivo popular nos seus contos.
HA: Proibiram-me de usá-lo porque não é didático. Aparentemente, é didático mostrar animais que insultam o patinho feio sem nenhumas consequências.
HT: Não gosta do seu conto mais conhecido?
HA: Do que restou do meu conto? Detesto. Ninguém morre. Desde o lançamento, cada vez que vejo um cisne, disparo de fisga.
HT: É curioso que o seu melhor conto foi na realidade escrito por outras pessoas.
HA: Onde está a minha fisga?
HT: Então, qual dos seus contos é o seu conto preferido?
HA: A Margarida. Sobre um pássaro e uma flor cativados, fechados numa gaiola onde morrem por serem esquecidos e abandonados.
HT: Voltando à pergunta do início da nossa conversa. A mensagem que quer transmitir às crianças é que a vida não tem sentido?
HA: Sim. É mesmo assim.

Małgorzata Stankiewicz

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