Resultados do 1º Concurso Literário Internacional do CLP/Camões em Lublin
De entre os contos recebidos de Espanha, Itália, Polónia e Uruguai, o júri decidiu atribuir o 1º lugar ex aequo a:
Kamila Wiśniewska, da Polónia, com o conto
“A tirania do Semsentido”
“O Semsentido é um monstro maligno e poderoso
que dispõe de uma força argumentativa admirável e ao mesmo tempo
surpreendentemente fácil, pois toda a sua arte consiste em assegurar a sua
vítima de que as atividades diárias dela simplesmente não têm sentido nenhum.
Para realizar este objetivo, serve-se de um programa minucioso de desmotivação
com o que doutrina o seu preso aplicando-lhe dia após dia umas colheres bem
medidas de tristeza e decepção. Se a vítima é propícia ao tratamento, o
Semsentido não demora em apoderar-se dos seus pensamentos para os converter
depressa em rios pretos que desembocam no oceano de sem sentido onde naufragam
todas as lembranças positivas e os velhos sonhos. Saibam, que este malvado é
muito ágil. Espera por um momento adequado, um derrubamento instantâneo, um
leve extravio do teu curso vital, um curto suspenso na lucidez da mente para
fazer o ninho cómodo na tua cabeça. O Semsentido é o rei do espaço urbano.
Gosta de se refestelar nas escadas da loja de bebidas tanto como nos
escritórios dos homens de negócios. Revela uma afeição pelos estudantes,
especialmente pelos da Faculdade de Letras. Muitas vezes aproxima-se da zona
universitária para se divertir, pois agrada-lhe o gosto pela inutilidade que
revelam. É entusiasta das longas tardes de inverno e as noites de insónia. Vaga
então pela cidade à procura de uma cabeça inútil onde possa dormir arrulhado
pela triste melodia dos pensamentos pesados como a velha locomotiva a vapor.”
(…)
Serena Cacchioli, de Itália, com o conto
“Se o caso é chorar”
“Uma das coisas de que mais gosto nesta minha nova
condição solitária é o facto de poder gradualmente reconhecer os lugares e as
pessoas que até há pouco tempo me eram estranhos. Gosto de me surpreender com a
atenção que dispenso aos empregados de mesa nos bares, às caixeiras, aos vizinhos...
É algo novo para mim, sempre tão centrado exclusivamente na minha pessoa. Gosto
de, finalmente, ter tempo de levantar os olhos e cruzar os dos desconhecidos.
Há um empregado no café Pôr do Sol que sorri muito, tem os ombros largos e
magros e na minha cabeça já passei a chamá-lo «o islandês», por ter os olhos
amendoados. Um dia perguntar-lhe-ei de onde vem. Gosto também de fazer as
compras na única loja que encontrei por aqui e vou lá sempre nos horários da
caixeira de ar desesperado. Uma espreitada naqueles olhos possessos, enquanto
pago o colutório e os iogurtes, melhora instantaneamente o meu dia e isca uma
série de fantasias que acabam por ocupar grande parte das minhas tardes. Um dia
perguntar-lhe-ei como se chama, e que raio de demónio lhe assombra
continuamente os olhos.” (...)
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