A música da verdade

„As canções, para mim, eram mais importantes do que mero entretenimento. Eram as minhas preceptoras e guias para uma consciência alternativa da realidade” – assim assinou o papel da música na sua vida uma lenda do mundo não só musical mas ultimamente também literário, Bob Dylan. Encontrar uma pessoa que não gosta de música não seria uma das coisas mais fáceis no mundo. É a parte das nossas vidas e, para alguns, toda a vida. É o sinal da identidade dos povos desde os tempos mais antigos até agora, portanto, ouvir música é como viajar sem necessidade de sair de casa. Às vezes basta só uma canção para nós ficarmos contentes ou recordarmos um momento especial.
No entanto, se pensamos que a música é só entretenimento, vejamos o que é que significa a música de intervenção. A ditadura no século XX afetou tanto a Polónia como Portugal. Nós, os jovens que temos a sorte de viver num país livre não pensamos muito nos absurdos e dificuldades da vida diária nesse período. Se tivesse passado muito tempo isto seria compreensível mas foram os tempos dos nossos pais, mas agora, se calhar felizmente, já parecem ser muito distantes. Se não sabemos muito sobre o século passado, uma boa fonte de conhecimento histórico, para alguns mais interessante do que os livros, são… as canções. Um dos modos de rebelar-se contra o sistema era, tal como o teatro e a literatura, a música. Convencidos de que a palavra podia mudar o mundo, os artistas começaram a criar canções que criticavam a situação sociopolítica no país e que chamavam à atenção das pessoas para não ficarem indiferentes mas terem esperança num um amanhã melhor. „A música de esperança” surgiu antes mas foi especialmente presente nos últimos anos das ditaduras quando a censura não era tão restritiva.
Na Polónia o comunismo terminou no ano 1989 e em Portugal, o salazarismo, em 1974. Imaginem que não podem comprar o disco nem ouvir a música do vosso artista favorito. Na Polónia, já nos anos 50 quando, com o nascimento do rock and roll começou a nova era na história mundial, as autoridades tentavam impedir o desenvolvimento das novas, se calhar perigosas, correntes. Com o tempo, uma força imprevista, os jovens, que se rebelavam contra a ditadura, desempenhavam um papel cada vez mais importante na sociedade. Eventos sociais significativos, momentos de solidariedade e unidade foram os festivais em Jarocin, onde muitos grupos tocaram a música de intervenção. Quando uma banda cantava uma canção, o público mudava a letra, por exemplo em vez de: Não tenhas medo de tudo isto, eles certamente preferiam o texto: Não tenhas medo do Jaruzelski. Embora parecesse que não havia um lugar melhor para as mensagens sociais, as autoridades controlavam tudo, chegando a inventar as informações falsas sobre as bandas.
Como ser mais astutos do que eles? Frente ao sistema e aos censores, porque uma canção antes de ser gravada e publicada tinha de passar por um caminho longo, os músicos inventavam letras com o significado escondido, através dos símbolos, metáforas, eufemismos. Não se podia criticar diretamente o governo e a mais pequena alusão despertava a suspeita. Isto era um desafio e exigia muita criatividade do autor, no entanto, há casos, onde a mensagem é bastante direta mas os censores simplesmente não deram conta porque diz-se que não sabiam ouvir o rock.

Em Portugal a música de intervenção surgiu nos anos sessenta e o primeiro artista foi José Afonso. As suas canções foram uma chamada de atenção às pessoas que sabiam já, com uma situação crítica e ainda agravada pelo regime do Estado Novo, que chegou o tempo das mudanças. O tempo para lutar pelos direitos e pelas boas condições de trabalho e de vida. O regresso às raízes como o fado, o texto reflexivo, poético e sincero foram animando o povo, até um dia de Abril...
Na Polónia os artistas e grupos mais importantes nesse período eram Kult, Czesław Niemen, Manaam, Dżem, Brygada Kryzys, Dezerter.


Apesar do perigo de acabar numa prisão ou até de ter de abandonar o país os artistas não tinham medo de dizer a verdade. A música era uma das muitas formas de lutar contra o regime. Acho que hoje em dia podemos estar agradecidos por viver num país livre, procurar sempre a verdade e nunca ter medo de dizê-la.
Marta Adamczuk
3º ano de Filologia Ibérica

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