A festa de São Jacinto


Uma das minhas lembranças da infância são as festas populares que se celebravam em honra do patrono da igreja local, são Jacinto. No meio do bonito mês do agosto, quando ainda fazia calor e as pessoas andavam relaxadas, o Jacinto convidava todos os habitantes do meu bairro industrial em Gliwice para a sua festa.
Por esta ocasião a rua em frente da igreja ficava fechada à circulação e estendiam-se as bancas carregadas de brinquedos de origem chinesa. Os avós generosamente ofereciam aos seus netos dinheiro que se esgotava num instante. Os miúdos tentados pelos pavilhões com armamento carregavam as suas pistolas de plástico que ao disparar transtornavam os sons da música festivaleira e deixavam uma nuvem de fumo asfixiante. Num ano, o verdadeiro hit eram as grandes e peludas tarântulas com uma corda o que possibilitava levá-las a passear como se fossem os cãezinhos e aterrorizar desta maneira os animais domésticos. Noutro, estavam na moda os olhos artificiais em forma de bolinhas pequenas que depois circulavam por toda a escola.
No pavilhão de doces reuniam-se todos. As velhotas compravam bolos de mel e os croissants de são Jacinto. As crianças preferiam uma espécie de pastilha elástica comprida e extremamente ácida que provocava o concurso de caretas.
O ponto central (o mais excitante) era o sorteio. O dia todo compravam-se bilhetes, no entanto os prémios mais valiosos esperavam até à noite, quando toda a gente se reunia para ouvir com inquietação o veredito. O prémio principal era a figura do nosso patrono, mas a esmagadora maioria das pessoas preferia obter algum eletrodoméstico. Então, para que o santo não chegasse a mãos indignas, (para que ninguém o tratasse como se fosse umaa escultura que serve para enfeitar o jardim) ficava sempre com ele um dos membros do conselho paroquial.
À noite havia um concerto, em que não participavam os coros nem músicos gospel, senão as verdadeiras estrelas pouco brilhantes. Era como um concurso de talentos: os comediantes entretinham a platéia falando na língua silesiana, havia uma apresentação da escola local de idiomas que também se ocupava de dança, um grupo de entusiastas cantava os grandes hits italianos (“não sabemos italiano, nas conseguimos aprender os textos de cor, porque é uma língua muito bonita”).
E o Jacinto? Parece que ninguém pensava nele (salvo o feliz dono da sua figura enorme). Se calhar divertia-se bem vendo a criatividade do seu povo e repousou com alívio de que esta vez também não partilharia o destino dum duende de jardim.

Kamila Wiśniewska

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