Na pele dum homem estátua ou um dia descansado



    De manhã visto a capa comprida e preta em que me posso esconder completamente. O chapéu grande enfeita-me a cabeça. Tenho a cara coberta com tinta branca. Dirijo-me à praça central e lá coloco-me à sombra da igreja. Durante as próximas horas vou desempenhar o papel dum homem estátua.
   Tenho que estar inamovível como um monumento. Reter os movimentos e as caretas. O dia está quente e o céu limpo. A minha capa negra atrai os raios do sol, enquanto a praça se enche de gente. Observo o meu público acidental. Conto os membros da excursão escolar lembrando-me que não posso mover a cabeça. Algumas crianças travessas tentam desconcertar-me, mas não me deixo. Os treinos de bailado ajudam-me agora a manter o equilíbrio. Alguns param e olham para mim com insistência e espanto. Outros atrevem-se a agarrar a minha capa. Superar o ataque massivo das crianças curiosas é um desafio. O seu assombro faz-me rir, mas detenho os músculos da cara porque não sou palhaço. Depois, os turistas ingleses aproximam-se com as suas máquinas fotográficas e desta vez também contenho o sorriso que quer aparecer instintivamente. Um homem com folhetos tenta desconcertar-me com um e além disso, como para chatear, vêm-me à cabeça as histórias que querem provocar uma explosão de gargalhadas. Depois de três horas, felizmente já não tenho este problema, porque a dor das costas facilita manter o rosto concentrado. Divirto-me observando a vida da cidade nas horas de ponta. O fluxo das pessoas correndo ao sons inadequados do violino dum músico vagabundo. Finjo que estou a ver um filme cuja acção se desenvolve em frente de mim. Outra vez, imagino que sou um jogral medieval, tendo cuidado para que não esquecer que hoje sou só um elemento da composição deste lugar. No entanto, alegra-me muito que as pombas não se deixam convencer que seja um monumento e preferem reunir-se na estátua familiar de Mickiewicz.
Assim foi o desejado dia quando não fiz simplesmente nada, mas cansei-me excessivamente. Acho que vou gastar o meu dinheiro numas férias.
Kamila Wiśniewska
II ano filologia ibérica

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