Entrevista com a minha avó

Os nossos avós voltam sempre às recordações dos anos da sua juventude. Temos a impressão de que eles se lembram melhor dos acontecimentos que tiveram lugar antes do que do momento. Às vezes, são as aventuras engraçadas da infância, às vezes as histórias cheias de emoções da guerra. Vale a pena anotá-los todos! Como escreveu S.J. Lec – “pode-se fechar os olhos à realidade, mas não para as memórias”, porque as memórias são imortais...
- Avó Filomena, podes falar-me sobre a tua infância?
- Nasci em Ruszów há 78 anos. Era uma pequena aldeia onde viviam apenas algumas famílias. Até à aldeia mais próxima tinha 6 quilómetros e para a cidade 12. Vivíamos perto da floresta e passávamos ali a maioria do tempo. Durante o verão apanhávamos os morangos, framboesas e no outono avelãs. A casa vinham os veados, corços e aves selvagens. Os meninos adoravam brincar com uma parte do fogão chamada “fajerka”, um aro de metal, que faziam rolar.
- Como era a tua casa?
- Era toda de madeira e não era muito grande. Ao lado estava o celeiro e o estábulo e outros edifícios utilizáveis. O meu avô construiu-a no lugar de outros edifícios.
- O que aconteceu com eles?
- É uma história triste. Anteriormente, os nossos parentes moravam lá. Uma vez foram para o campo deixando na casa uma filha pequena de 6 anos. A criança, inconsciente do perigo, começou a brincar com fósforos e provocou um incêndio. Queimaram-se três casas com todos os pertences.
- É realmente terrível…
- Antigamente, não se cuidava tanto das crianças como atualmente. Os pais tinham de tratar do campo. Não haviam máquinas que melhoravam ou aceleravam o trabalhos. Os menores eram deixados em casa enquanto os mais velhos ajudavam no campo com o trabalho.
- Quantas pessoas viviam na tua casa?
- Os meus avós, pais e seis filhos. Havia um monte de gente e por isso não havia muito espaço mas tivemos de lidar com tais condições como eram, e ninguém sequer pensou em queixar-se.
- E de que tinham dinheiro?
- Tínhamos uma grande fazenda. Os meus pais trabalhavam no campo, tinham 40 hectares de terra. Criávamos vacas, cavalos, porcos e galinhas. Vendíamos trigo, leite, ovos e principalmente vivíamos disso.
- Havia lá uma escola?
- Infelizmente não. A escola estava numa aldeia vizinha. Todos os dias tínhamos de percorrer um caminho muito longo. Na maioria das vezes a pé, às vezes o meu pai atrelava o cavalo à carroça e levava-nos assim para a escola. Havia também lá uma igreja. Ensinava-nos uma mulher que no início veio só para o estágio mas decidiu ficar lá mais tempo. Na turma haviam as crianças de diferentes idades, desde a primeira até à sétima classe. Ela tinha de preparar o trabalho para todas as idades. Era muito talentosa. Lembro-me de danças, cantos e declamações de poemas. Preparava-nos muito bem.
- Como era a vida durante a guerra?
- No verão, nós dormíamos na floresta. Tínhamos medo de que durante a noite viessem os alemães e nos matassem. Quando dormíamos em casa, dormia sempre vestida, sentada, no caso de ter de fugir. Quando o meu pai ouvia algo perturbador, fugíamos sempre para a floresta. Uma vez capturaram-no. Fingiu que era compatriota porque falava mais ou menos alemão. Ordenaram-lhe rezar. Mas ele não sabia as orações em alemão. Apenas fez o sinal da cruz e felizmente deixaram-no. Uma vez chegaram com uma carroça e roubaram tudo. Roupas, panelas, bicicleta, todo o equipamento para casa. A minha mãe chorava e pediu-lhes que devolvessem as coisas das crianças. Neste momento um alemão colocou uma arma no seu peito e ameaçou que a fuzilava se não voltasse já para casa. Nunca vou esquecer esse medo. No entanto, quando descobriram que o meu pai era sapateiro, começaram a tratar-nos um pouco melhor. Mas em 1942 a população de Ruszów foi expulsa pelos alemães. A maioria das pessoas foram levadas para a Rotunda em Zamość, para Majdanek, e para muitos outros campos de concentração nazis. Os homens mais fortes foram deportados para o trabalho nas profundezas do Terceiro Reich. Mais tarde, a área foi habitada por colonos alemães. Nós fugimos para a nossa família que morava em Szewnia e de alguma forma conseguimos sobreviver.
- E como conheceste o teu futuro marido, o meu avô?
- Isto foi num baile no quartel de bombeiros. Nós dançámos juntos e conversamos. Mais tarde ele visitava-me de motocicleta. Naquele tempo isto era impressionante e as raparigas gostavam disso. Ele era um homem “desejável” na aldeia porque vivia ao lado da estrada principal asfaltada e trabalhava como motorista. Depois de um ano nós casamos. 

Justyna Teterycz
3º ano de Estudos Portugueses

Comentários

  1. Amei, sou brasileiro me chamo Alan Tetericz, trocaram o y pelo i mas talvez possamos ter parentesco.

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