“Aiii, crianças, crianças...”

“Aiii, crianças, crianças...” – acho que não há pessoa que nunca ouviu este desabafo da boca dos seus pais. Não restam dúvidas de que ele sempre vai constar da lista das frases favoritas dos nossos pais das que todo o mundo se vai lembrar sempre com carinho. Apesar disso, eu pessoalmente nunca soube o porquê dessas palavras. E nunca pensei que as usaria pela primeira vez num país tão remoto e dirigidas às crianças que não fossem os meus filhos. Até setembro de 2013 eu tinha bastante contato com crianças porque trabalhei numa escola de idiomas. Elas sempre me davam muita alegria e faziam com que me sentisse necessária. Sabia perfeitamente que podia não somente ajudá-las mas também aprender algo com elas. Mas, em setembro de 2013 eu conheci uma nova dimensão da palavra “professor” e “criança”. Na verdade, tudo começou quando decidi passar um semestre no Brasil como estudante de intercâmbio que funciona devido ao acordo entre a UMCS em Lublin e a UNIJUÍ em Ijuí. Os meus professores disseram-me que uma das regras de acordo diz que o intercambista tem que colaborar com a “etnia polonesa” cujo alvo é o de manter o espírito polaco nas cabeças de todas as pessoas que têm raízes na Polónia. Isso, entre outras coisas, significa mostrar aos mais pequenos como é a Polónia de hoje em dia, ensinar algumas frases na nossa língua etc. A mim sempre me fascinou ensinar e aquela ideia parecia-me muito boa. Assim, poderia ser prestável e ao mesmo tempo agarrar a oportunidade de ganhar experiência trabalhando com crianças no país da língua do meu interesse. Quando eu e o meu amigo, Bartek, finalmente chegamos ao Brasil, a etnia polonesa “saiu em disparada” com as ofertas e sugestões de fazer o projeto “Integrando Culturas”na escola IMEAB(Instituto Municipal de Ensino Assis Brasil). 

A ideia, como já mencionei, era divulgar a cultura e língua polacas por meio de brincadeiras, troca de conhecimentos etc. Na verdade não sabíamos o que esperar deste encontro mas tínhamos um bom palpite de que nunca nos iríamos esquecer dele. A professora e ao mesmo tempo o líder cultural, Marli Meigers, levou-nos a esta escola e demonos conta de que tanto a escola, quanto os estudantes eram bastante similares a tudo que conhecemos dos tempos da nossa infância na Polónia. Muito ruído nos corredores, muitos cartazes nas paredes e as pequenas criaturas passeando por todo o lado – uma imagem típica. 

 Começamos com a turma de crianças de 10 anos. Apresentamo-nos no centro da sala e ao mesmo tempo no centro de olhares curiosos. Sentíamo-nos como se fôssemos estrelas de cinema! A professora fez a menção de onde e de quem éramos e depois de trocarmos olhares ansiosos entre nós dois começamos uma curta apresentação de todos os aspetos mais importantes da Polónia que todo o mundo deveria saber. Mostramos a nossa bandeira, explicamos a história das cores dela, contamos algumas lendas polacas, falamos das banalidades quotidianas até que reparamos que o tempo da aula quase terminou! Tínhamos ainda alguns minutos para à pressa responder às perguntas e assim começou uma enxurrada de indagações. Com muita dificuldade a professora conseguiu acalmar os alunos e pudemos atender à curiosidade das crianças. A segunda turma era de 12 anos. Já tínhamos as bases do funcionamento num grupo de miúdos então foi um pouco mais fácil. Assim como no caso da turma de 10 anos, acolheram-nos de braços abertos e com as cabeças cheias de interrogações. Para começar com algo interessante, mostramos-lhes um dos nossos poemas mais famosos para crianças – “Lokomotywa” escrito por Julian Tuwim e lido por Piotr Fronczewski. 

Os alunos adoraram a língua polaca e todos os sons produzidos por Piotr Fronczewski durante a leitura! Acharam o nosso idioma muito difícil mas também muito lindo e não cessavam de nos pedir para que lhes ensinássemos algumas palavras. Assim, conheceram os nomes de alguns animais, frutas, vegetais e muitos outros. Fizemos também um pequeno concurso para ler os primeiros versos deste poema em polaco. Todos nós (inclusive o Bartek, que até então não gostava muito de crianças) passamos os momentos de muita alegria! Depois chegou o momento de falarmos um bocado e, como se viu, para moldarmos a opinião do povo ijuense sobre a Polónia de hoje em dia. Eu e o Bartek ficamos boquiabertos ao ouvir perguntas como: “vocês lá na Polónia conhecem computadores?” ou “lá na Polónia já se usam carros?”. Pessoalmente, fiquei abalada mas felizmente o Bartek não permitiu que aquele choque pequeno dominasse o meu comportamento e tomou as rédeas da situação, explicando com muitos pormenores a situação atual da Polónia. No fim das contas tudo terminou bem e saímos contentes com o sentimento de que cumprimos a nossa missão como patriotas. 

 A última turma foi a de que eu mais gostei porque todas as crianças eram muito simpáticas, prestavam muita atenção ao que nós contávamos e colaboravam connosco. Havia também momentos muito engraçados. O Bartek escreveu uns versos de “Lokomotywa” no quadro e eu andava ao redor da sala ajudando a soletrar as palavras. Em algum momento, um aluno chamou-me. “- Moça, moça! - Sim, como te posso ajudar? - Nada... Só te queria dizer que você tem os olhos mais lindos de todos os que eu vi na minha vida...” Eu estive perto de cair na gargalhada mas consegui manter as aparências e somente sorri. Em suma, todo o nosso esforço deu certo. Ao sair das salas de aulas os alunos despediam-se de nós gritando os nossos nomes e perguntando quando poderíamos visitá-los novamente. Depois disso muitas vezes dava de caras com alguns alunos do IMEAB no centro da cidade ou numa loja e ficavam sempre muito contentes de poder falar um bocado com a sua “professora” que veio do outro lado do oceano. Sejam quem forem, sejam de onde forem, as crianças vão ser sempre as criaturas que nos dão muita alegria e o sentimento de sermos mais jovens (até mesmo com22 anos). Agora, quando podia conhecer pessoalmente este “lado de vida” onde eu sou a pessoa que mostra o mundo aos mais pequenos, percebo bem o porquê de todos os suspiros e todos os sorrisos dos meus país.

Katarzyna Rejter
3º ano de Estudos Portugueses

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