Tascas de Portugal

  Tasco, adega, taberna, casas de pasto, tasca, … foram estes e muitos mais os nomes que designavam este tipo de lugar que dava e dá muita originalidade e individualismo às cidades portuguesas. Fosse qual fosse o vocábulo, nenhum conseguia aliviar a carga negativa que a ideia e o seu local pressupunham, pois as tascas desde o seu início estavam relacionadas com o povo, com os operários das fábricas, do mar e da terra, com a classe média, em cujos bairros a instituição de tasca era obrigatória. Ao longo do tempo iam aparecendo novos termos que caracterizavam, de forma pejorativa, o sítio e a gente deste ambiente.
  Tascos, cujo espírito e clima não são fáceis de capturar, poderiam ser definidos como “pequenos estabelecimentos de vinhos, comunicados com a rua através de uma porta de vaivém imposta por uma lei do tempo de Salazar, por razões de moralidade pública” (Pinto, Raul Simões, 2007:9). As tabernas tão frequentemente apelidadas de tascas, onde se reunia a gente local do bairro, não se diferenciavam muito dos outros estabelecimentos tais como restaurantes, salões de chá, pastelarias ou cafés. Em qualquer destes lugares, a gente reunia-se com o mesmo objetivo: conviver, comunicar, degustar e beber conforme os gostos, hábitos e capacidades financeiras. A única diferença era o tipo de gente que os frequentava.
  Os tascos sempre representaram “um mundo masculino fechado”. Durante muito tempo, as crianças e as mulheres honestas não podiam lá entrar. Eram sítios onde a gente falava abertamente sobre assuntos tais como a política, os amores, os problemas sociais, as questões de honra ou de dinheiro. As tascas até hoje continuam a ter o seu caráter especial não só como lugar onde se pode comer e beber, mas também reunir e encontrar os amigos. A vizinhança dos bairros e fiéis clientes cria o ambiente próprio destes pequenos espaços. Por esta razão, a tasca é mais que um lugar para encher o estômago, é um lugar de reunião e convivência social.
  Hoje em dia as tascas estão enraizadas na paisagem cultural do país. Quase todas as que existem encontram-se nas mãos dos proprietários privados muitas vezes herdadas de geração em geração. O que as caracteriza e distingue dos restaurantes modernos ou grandes cadeias, como a McDonald´s, são os pequenos espaços, os pratos típicos que vêm do povo e da tradição culinária do país, e o interior, que em muitos casos não foi mudado durante anos. O vinho caseiro, servido em garrafas sem rótulos, supera muitas vezes a qualidade das marcas disponíveis nas lojas.
O interior, símbolos e adornos 
  O aspeto interior da maioria das tascas pode provocar uma certa confusão. O ambiente surpreende com certa austeridade da decoração ou simplesmente com a “pobreza”. Muitas delas lembram os tempos do início do século XX. Praticamente não mudaram em termos estéticos até hoje. Uma coisa que pode surpreender é o espaço reduzido. Normalmente pequeno, com poucas mesas rústicas de madeira. O balcão, que serve para as pessoas que vêm sem companhia, é um lugar muito importante nas tascas. No balcão conversa-se, bebem-se uns copos e fala-se sobre assuntos políticos e sociais. As paredes são decoradas, de vez em quando, com azulejos, ladrilhos com desenhos, ou simplesmente pintados a cores. Nas paredes podem-se observar fotografias que comemoram acontecimentos significativos da tasca como reuniões de cursos, aniversários e festas. Dependendo da cidade ou bairro, algumas das tascas são templos para os fãs de futebol. A importância do futebol, que em Portugal é inquestionável, é refletida nas paredes de alguns sítios. Muitos deles reúnem lembranças e emblemas dos clubes,  tais como troféus, taças, fotos, cartazes, bilhetes, cachecóis, que muitas vezes são tratados com a mesma seriedade e respeito que as relíquias. Por cima dos balcões e nas paredes das tascas estão fotos de clubes das cidades portuguesas. Muitas vezes as tascas convertem-se em verdadeiros santuários clubistas.
  Existem também alguns símbolos básicos nas tascas, fortemente relacionados com a tradição e a identidade portuguesa. O famoso “Zé Povinho“ - personificação nacional portuguesa com o seu manguito característico. Aparece muitas vezes simbologia religiosa. Santo António, São João e Senhora da Fátima. Símbolos fálicos, cornos, cabeças, algumas pipas, muitos garrafões de vinho, ramos de loureiro a enfeitar e contra os maus cheiros. As fotos dos donos, as redes de pesca, os tachos pendurados na cozinha. As violas e o xaile, pois as tascas estavam relacionadas com o fado onde se tocava esta música tradicional portuguesa. 
Gastronomia
  A comida das tascas, desde o seu aparecimento, estava relacionada com os pratos típicos portugueses ou estritamente relacionada com a região onde se encontrava o local.   A comida da tasca, além de ser saborosa e tradicional, era associada a preços acessíveis para qualquer pessoa. Diz-se que lá se pode experimentar o verdadeiro sabor de Portugal  e conhecer o espírito português, especialmente em relação ao turismo e aos estrangeiros. Dado o seu típico caráter português, poucos estrangeiros têm noção da sua existência. Muitas vezes são substituídas pelos restaurantes modernos ou as já bem conhecidas cadeias internacionais de comida rápida. A oferta da tasca surpreende com a riqueza e a grande variedade de comida. Na ementa, pode-se observar a geografia culinária do país, do sul até ao norte. Estão presentes pratos universais como sardinhas assadas - o verdadeiro símbolo de Portugal e uma das sete maravilhas gastronómicas do país, ou o famosíssimo bacalhau preparado conforme a fantasia dos proprietários. O Porto convida as pessoas com a sua excelente francesinha. As tripas à moda do Porto são mais uma joia da cozinha do norte do país. Mais para baixo, na região da Beira Litoral podemos experimentar a chanfana. Do sul do país vem a carne de porco à alentejana. Em qualquer lado do país serve-se cozido à portuguesa. Além da grande variedade de comida, as tascas são famosas acima de tudo graças ao vinho. O vinho é o produto nacional português. A cultura e a tradição vinícolas encontram-se por todo o país. Nas tascas, o vinho serve-se normalmente em jarros. A escolha entre os tintos e brancos, maduros e verdes não é fácil. Quem gosta de comida autêntica, ambiente familiar e bom vinho não vai ficar desapontado.
Decadência e tempos de crise
  Hoje em dia, o negócio da tasca não vive tempos de ouro como há algumas décadas atrás. A crise económica e a entrada da nova moeda não foram muito favoráveis para estes estabelecimentos. O negócio, cuja melhor altura estava relacionada com o movimento operário e a revolução industrial, tem que lidar com os problemas contemporâneos como a concorrência por parte dos restaurantes modernos, falta de gente e de interesse por parte dos jovens. Os hábitos das pessoas iam-se alterando à medida que surgiam novos focos de interesse. Parece que os maiores culpados são os centros comerciais com as grandes cadeias internacionais de comida rápida. Só os velhos, algum pessoal de meia-idade e de vez em quando jovens curiosos que passam por lá. Muitos adolescentes fogem das tascas por causa da comida caseira e escolhem a comida de plástico, a coca-cola e as batatas fritas.
  A perda gradual de importância destes sítios únicos levou à criação da semiorganização LATA - Liga dos Amigos das Tabernas Antigas, cujo objetivo é recuperar o significado e chamar à atenção da clientela. Um dos seus projetos é a criação das “Rotas das Tabernas“ para abrir estes espaços ao público mais amplo, torná-los mais limpos e asseados e ao mesmo tempo modernizá-los, mantendo o mesmo espírito. A primeira “Rota das Tabernas“ apareceu em Coimbra em 2009(Visão). Apesar dos tempos de decadência das tascas, vale a pena visitar este distinto universo, considerado por alguns como património histórico-cultural do país.
Joanna Wałek

Fontes de informação:
Mafalda Cezar Machado, Tascas de Portugal, Inapa, 2008
Raul Simões Pinto, Tascas do Porto, Livros Afrontamento, 2007
 * Foto: O Sr. Raul, proprietário da afamada tasca Casa Boquinnhas de Viseu
*Este texto faz parte do artigo apresentado no Congresso dos Estudantes Lusitanistas da Polónia, intitulado Tradição e Modernidade - Portugal e Lusofonia que decorreu no Instituto de Camões em Lublin.




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